O HOMEM DEPOIS
DA MORTE
Estudo
com base na obra O QUE É O ESPIRITISMO, Cap. III, Solução
de alguns problemas pela Doutrina Espírita, O Homem depois da morte, do item 144 em diante.
Obra
de Allan Kardec.
A separação ou libertação
da alma por ocasião da morte do corpo físico, se opera gradualmente e com uma
lentidão variável, segundo os indivíduos e as circunstâncias da morte. Os laços
que unem a alma ao corpo não se rompem senão pouco a pouco, e mais ou menos
lenta quanto a vida foi mais material e vulgar em relação ao sensualismo. (1)
No momento da morte,
primeiro tudo é confuso; a alma precisa de algum tempo para se reconhecer,
porque está meio atordoada, é como o estado de um homem que vai acordando de
sono profundo e que procura inteirar-se da sua situação. A lucidez das ideias e
a memória do passado lhe retornam à medida que se desfaz a influência da
matéria da qual acaba de se libertar, e que se dissipa a espécie de bruma que
obscurece seus pensamentos.
A duração da perturbação
que se segue à morte é muito variável; pode ser de algumas horas somente, como de
vários dias, de vários meses e mesmo de vários anos. Ela é menos longa naqueles
que, durante a vida, se identificaram com seu estado futuro, porque compreendem
imediatamente sua situação, porém é tanto mais longa quanto o homem tenha
vivido mais materialmente.
As sensações que a alma
experimenta nesse momento são também muito variáveis. A perturbação que segue a
morte nada tem de penosa para o homem de bem. Para este ela é calma e em tudo
semelhante à sensação que acompanha um despertar pacífico. Para aquele cuja
consciência não é pura e que está mais preso à vida corporal que à espiritual,
ela é cheia de ansiedade e de angústias que aumentam à medida que ela se
reconhece; porque então ela está tomada de medo e de uma espécie de terror em
presença daquilo que vê, e sobretudo daquilo que entrevê.
A sensação que se
poderia chamar física é a de um grande alívio e de um imenso bem-estar. Sente-se
como livre de um fardo, e se está muito feliz por não experimentar mais as
dores corporais por que era afetado poucos instantes antes de se sentir solto,
desligado e alerta como quem viesse a ser libertado de pesadas correntes.
Na sua nova situação, a
alma vê e ouve o que via e ouvia antes da morte, mas vê e ouve outras coisas
que escapam à grosseria dos órgãos corporais. Neste seu no estado ela tem
sensações e percepções que nos são desconhecidas (2)
É importante dizer que à
situação da alma depois da morte ou durante a vida, não são o resultado de uma
teoria ou de um sistema, mas de estudos diretos feitos sobre milhares de
indivíduos observados em todas as fases e em todos os períodos da sua
existência espiritual, desde o mais baixo até o mais alto grau da escala,
segundo seus hábitos durante a vida terrestre, o gênero de morte, etc. Diz-se, frequentemente,
falando da vida espiritual, que não se sabe o que lá se passa porque pessoa
alguma dela retornou, mas é um erro, uma vez que são precisamente os que lá se
encontram que vêm dela nos instruir, e Deus o permite hoje como uma advertência
dada à incredulidade e ao materialismo no que se refere a pluralidade de existências
do espírito.
As faculdades
perceptivas da alma são proporcionais à sua depuração, assim, somente às almas
de elite tem condições para gozar da presença de Deus.
Deus está por toda parte
porque Ele irradia em todas as porções do espaço, e pode-se dizer que o
Universo está mergulhado na divindade, como nós estamos mergulhados na luz
solar. Mas os Espíritos atrasados são rodeados de uma espécie de neblina que o
oculta aos seus olhos, e que se dissipa na
mesma medida que eles se depuram e se desmaterializam. Os Espíritos
inferiores são, pela vista, com relação a Deus, o que os encarnados são com
relação aos Espíritos: verdadeiros cegos.
Se as almas não tivessem
mais individualidade depois da morte, seria para elas, e para nós, como se não
existissem, e as consequências morais seriam exatamente as mesmas. Elas não
teriam nenhum caráter distintivo, e a do criminoso estaria no mesmo plano da do
homem de bem, o que ocasionaria o desinteresse em fazer o bem.
A individualidade da
alma foi posta a descoberto de uma maneira, por assim dizer, material, nas
manifestações espíritas, pela linguagem e as qualidades próprias de cada uma. Uma
vez que elas pensam e agem de uma maneira diferente, disso resulta, que umas
são boas e outras más, umas sábias e outras ignorantes, umas querem o que
outras não querem, isso é a prova evidente de que elas não estão confundidas
num todo homogêneo, sem falar das provas patentes que nos dão de terem animado
tal ou tal indivíduo sobre a Terra. Graças
ao Espiritismo experimental, a individualidade da alma não é mais uma coisa
vaga, mas um resultado da observação.
A própria alma constata
sua individualidade, porque tem pensamento e vontade próprios, distintos das
outras. Ela, inclusive, a constata pelo seu envoltório fluídico ou perispírito,
espécie de corpo limitado que faz dela um ser à parte. (3)
Existem aqueles que
creem fugir à censura de materialistas ao admitirem um princípio inteligente
universal do qual absorvemos uma parte ao nascer, o que constitui a alma, para
devolvê-la depois da morte à massa comum onde ela se confunde como as gotas
d’água no Oceano. Esse sistema, espécie de transação, não merece o nome de
espiritualismo, porque é tão desesperador quanto o materialismo. O reservatório
comum do todo universal equivaleria ao nada, uma vez que aí não haveria mais
individualidades.
O estado da alma varia
consideravelmente segundo o gênero de morte, mas, sobretudo, segundo a natureza
dos hábitos que teve durante a vida. Na morte natural, o desligamento se opera
gradualmente e sem abalo; frequentemente, ele começa mesmo antes que a vida se
extinga. Na morte violenta por suplício, suicídio ou acidente, os laços se
rompem bruscamente. Nestes casos, o Espírito, surpreendido pelo imprevisto,
fica como atordoado pela mudança que nele se opera e não compreende sua
situação. Um fenômeno mais ou menos constante, em semelhante fato, é a
persuasão em que se acha de não estar morto, e essa ilusão pode durar vários
meses e mesmo vários anos. Nesse estado, vai, vem e crê aplicar-se aos seus
trabalhos, como se fosse ainda deste mundo, muito espantado que não respondem
quando ele fala. Essa ilusão não é exclusivamente dos casos de mortes violentas,
mas também, é encontrada nos indivíduos cuja vida foi absorvida pelos gozos e
interesses materiais. (4)
A
alma depois de ter deixado o corpo não
se perde na imensidade do Infinito, como geralmente se figura. Ela erra (5) no
espaço e, o mais frequentemente, no meio daqueles que conheceu, e sobretudo
daqueles que amou, podendo se transportar instantaneamente a distâncias
imensas.
A alma conserva
todas as afeições morais, dessa forma, não esquece senão as afeições materiais
que não são mais da sua essência. Por isso, vem com alegria rever seus parentes
e seus amigos, e é feliz por dela se lembrarem (6)
A conservação da
lembrança do que fez sobre a Terra ou o interesse pelos trabalhos que deixou
inacabados depende da elevação do
Espírito e da natureza dos seus trabalhos. Os Espíritos desmaterializados pouco
se preocupam com as coisas materiais, das quais são felizes de estarem livres.
Quanto aos trabalhos que começaram, segundo a sua importância e a sua
utilidade, eles inspiram, algumas vezes a outros o pensamento de terminá-los.
A alma não somente reencontra no mundo dos
Espíritos os parentes e amigos que a precederam, mas reencontra, também, aí muitos outros que havia conhecido nas suas
precedentes existências. Geralmente, aqueles que por ela mais se afeiçoam vêm
recebê-la na sua chegada ao mundo dos Espíritos, e a ajudam a se libertar dos
laços terrestres. Entretanto, a privação do reencontro com as almas mais
queridas, algumas vezes, é uma punição para as almas culpadas.
O desenvolvimento
incompleto dos órgãos da criança não permite ao Espírito da
criança morta em tenra idade se
manifestar completamente, porém, liberto desse envoltório, suas faculdades são
as que tinha antes da sua encarnação. O Espírito não tendo passado senão alguns
instantes na vida, suas faculdades não puderam se modificar. (7)
A
diferença que há depois da morte, entre a alma do sábio e do ignorante, do
selvagem e do homem civilizado é, aproximadamente,
a mesma diferença que existe entre eles durante a vida, porque a entrada no
mundo dos Espíritos não dá à alma todos os conhecimentos que lhe faltavam sobre
a Terra.
Depois da morte as almas progridem mais ou menos segundo sua vontade, e algumas progridem muito,
mas têm necessidade de colocarem em prática durante a vida corporal o que
adquiriram em ciência e em moralidade. Aquelas que estão estacionárias retomam
uma existência análoga à que deixaram, mas as que progrediram merecem uma
encarnação de uma ordem mais elevada.
O progresso, sendo
proporcional à vontade do Espírito, há os que conservam por longo tempo os
gostos e as tendências que tinham durante a vida, e que perseguem as mesmas ideias.
(8)
A fixação irrevogável da
sorte do homem depois da morte seria a negação absoluta da justiça e da bondade
de Deus, porque há muitos que não dependeram de si mesmos para se esclarecerem
suficientemente, sem falar dos idiotas, dos cretinos e dos selvagens (9), e das
inumeráveis crianças que morrem antes de terem entrevisto a vida. Mesmo entre
as pessoas esclarecidas, há muitas que puderam crer-se bastante perfeitas para
estarem dispensadas de fazer mais, e isso é uma prova importante que Deus dá da
sua bondade, permitindo ao homem fazer no dia seguinte o que não fez na véspera.
Se a sorte está
irrevogavelmente fixada (10), por que os homens morrem em idades tão
diferentes, e por que Deus, na sua justiça, não deixa a todos o tempo para
fazerem o maior bem possível ou reparar o mal que fizeram? Quem sabe se o
culpado que morreu aos trinta anos, não estaria arrependido, não teria se
tornado um homem de bem, se vivesse até os sessenta anos? Por que Deus lhes
tira esse meio enquanto dá a outros? Só o fato da diversidade da duração da
vida, e do estado moral da grande maioria dos homens, prova a impossibilidade,
se se admite a justiça de Deus, de que a sorte da alma seja irrevogavelmente
fixada depois da morte.
Na
vida futura, a sorte das crianças (11) que morrem em tenra idade é uma das questões que provam melhor a
justiça e a necessidade da pluralidade das existências. Uma alma que não
tivesse vivido senão alguns instantes, não tendo feito nem bem nem mal, não
mereceria nem recompensa nem punição. Segundo a máxima do Cristo, de que cada
um é punido ou recompensado segundo suas obras, seria, tanto ilógico como
contrário à justiça de Deus admitir-se que, sem trabalho, ela fosse chamada a
gozar da felicidade perfeita dos anjos, ou que pudesse disso ser privada, e,
todavia, ela deve ter uma sorte qualquer, pois um estado misto, pela eternidade,
seria também injusto. Interrompida uma existência desde o seu princípio, não
podendo ter, pois, nenhuma consequência para a alma, sua sorte atual é a que
merecia na sua precedente existência, e sua sorte futura aquela que merecerá
nas suas existências ulteriores.
Além das suas alegrias ou seus sofrimentos, as
almas têm ocupações na outra vida, pois se
elas não se ocupassem senão de si mesmas durante a eternidade, isso seria
egoísmo, e Deus, contrário ao egoísmo, não aprovaria na vida espiritual o que
pune na vida corporal. As almas ou Espíritos têm ocupações de acordo com seu
grau de adiantamento, ao mesmo tempo que procuram se instruírem e melhorarem. (12)
Atualmente, reconhece-se perfeitamente que o fogo do Inferno
é um fogo moral e não um fogo material, todavia, nem sempre se define a natureza
dos sofrimentos. As comunicações espíritas os colocam sob nossos olhos, e, por
esse meio, nós podemos apreciá-los e nos convencer de que, por não ser o
resultado de um fogo material, que não poderia queimar, com efeito, almas
imateriais, eles não são menos terríveis em certos casos. Essas penas não são
uniformes e variam ao infinito, segundo a natureza e o grau das faltas
cometidas, e são, quase sempre, essas próprias faltas que servem ao castigo. É
assim que certos homicidas são constrangidos a permanecerem sobre o lugar do
crime e a ter, sem cessar, suas vítimas sob seus olhos. Que o homem de gostos
sensuais e materiais conserva esses mesmos gostos, mas a impossibilidade de os
satisfazer materialmente é para eles uma tortura, assim, certos avarentos creem
sofrer o frio e as privações que suportaram durante a vida por avareza, outros
permanecem perto dos tesouros que enterraram e estão em transe perpétuo pelo
medo que os roubem; em uma palavra, não
há uma falta, uma imperfeição moral, uma ação má que não tenha, no mundo dos
Espíritos, sua contrapartida e suas consequências naturais; e, para isso
não há necessidade de um lugar determinado e circunscrito: por toda parte em que se encontre, o Espírito perverso carrega seu
inferno consigo.
Além das penas espirituais,
há penas e provas materiais que o Espírito, que não está depurado, suporta nas
novas encarnações, onde é colocado numa posição para suportar o que fez os
outros suportarem, ou seja, ser humilhado, se foi orgulhoso; miserável, se foi
mau rico; infeliz por seu filho, se foi um mau filho, etc. A Terra, como
dissemos, é um lugar de exílio e de expiação, um purgatório, para os Espíritos
dessa natureza, e no qual depende de cada um não retornar, melhorando-se
bastante para merecer ir a um mundo melhor. (13)
A prece é útil para as almas sofredoras, inclusive,
é recomendada por todos os bons
Espíritos. Por outro lado, ela é pedida pelos Espíritos imperfeitos como um
meio de aliviar seus sofrimentos. A alma pela qual se ora experimenta alívio,
porque é um testemunho de interesse e o infeliz é sempre aliviado quando
encontra corações caridosos que se compadecem de suas dores. Por outro lado,
ainda pela prece, estimula-se ao arrependimento e ao desejo de fazer o que é
preciso para ser feliz. É nesse sentido que se pode abreviar sua pena se, por
sua vez, ela secunda pela sua boa vontade. (14)
A justiça quer que a
recompensa seja proporcional ao mérito das almas, assim como a punição à gravidade da falta.
Desta maneira há, portanto, graus infinitos nos gozos da alma, desde o instante
em que ela entra no caminho do bem, até que atinja a perfeição.
A felicidade dos bons
Espíritos consiste em conhecer todas as coisas, não ter nem ódio, nem ciúme,
nem inveja, nem ambição, nem nenhuma das paixões que fazem a infelicidade dos
homens. O amor que as une é, para elas, a fonte de uma suprema felicidade. Elas
não experimentam nem as necessidades, nem os sofrimentos, nem as angústias da
vida material. Um estado de contemplação perpétua seria uma felicidade estúpida
e monótona, própria do egoísta, uma vez que sua existência seria uma
inutilidade sem limites. A vida espiritual, ao contrário, é uma atividade
incessante pelas missões que os Espíritos recebem do ser supremo, como sendo
seus agentes no governo do Universo; missões que são proporcionais ao seu
adiantamento e das quais são felizes, porque lhes fornecem ocasiões de se
tornarem úteis e de fazerem o bem. (15)
NOTAS
(1)
Durante a vida o Espírito está ligado ao corpo pelo seu envoltório material ou
perispírito; a morte é apenas a destruição do corpo, e não desse envoltório, que
se separa do corpo quando cessa a vida orgânica. A observação prova que no
instante da morte o desprendimento do Espírito não se completa subitamente; ele
se opera gradualmente, com lentidão variável, segundo os indivíduos. Para uns é
bastante rápido e pode dizer-se que o momento da morte é também o da
libertação, que se verifica logo após. Noutros, porém, sobretudo naqueles cuja
vida foi toda material e sensual, o desprendimento é muito mais demorado, e
dura às vezes alguns dias, semanas e até mesmo meses, o que não implica a
existência no corpo de nenhuma vitalidade, nem a possibilidade de retorno à
vida, mas a simples persistência de uma afinidade entre o corpo e o Espírito,
afinidade que está sempre na razão da preponderância que, durante a vida, o Espírito
deu à matéria. É lógico admitir que quanto mais o Espírito estiver identificado
com a matéria, mais sofrerá para separar-se dela. Por outro lado, a atividade
intelectual e moral e a elevação dos pensamentos operam um começo de
desprendimento, mesmo durante a vida corpórea, e quando a morte chega é quase
instantânea. Este é o resultado dos estudos efetuados sobre todos os indivíduos
observados no momento da morte. Essas observações provam ainda que a afinidade
que persiste, em alguns indivíduos, entre a alma e o corpo, é às vezes muito
penosa, porque o Espírito pode experimentar o horror da decomposição. Este caso
é excepcional e peculiar a certos gêneros de morte, verificando-se em alguns
suicídios. (Ver questões 155 e 155a de O Livro dos Espíritos).
(2)
Ver Allan Kardec, Revista Espírita, setembro de 1859, Morte de
um espírita:
Extraímos
deste número da Revista Espírita, a pergunta (de número 11) e a resposta feita
ao senhor J..., negociante do departamento da Sarthe, que morreu em 15 de junho
de 1859, bem como, a nota de Kardec referente a esta resposta:
Vossos
conhecimentos quanto às matérias espíritas vos permitiram, sem dúvida, nos
responder com precisão sobre certas questões. Poderíeis descrever-nos
claramente o que se passou em vós no instante em que o vosso corpo deu o último
suspiro, e quando o vosso Espírito se achou livre?
- R. É, eu
creio, pessoalmente muito difícil encontrar um meio para vos fazer compreender
de outro modo que não haja sido feito, comparando a sensação que se experimenta
ao despertar que se segue a um sono profundo;
esse despertar é
mais ou menos
lento e difícil
em razão direta
da situação moral do Espírito, e
não deixa nunca de ser fortemente influenciado pelas circunstâncias que
acompanham a morte.
Nota de Kardec - Isto está
conforme todas as observações que se fizeram sobre o estado do Espírito no
momento da sua separação do corpo; sempre vimos as circunstâncias morais e
materiais, que acompanham a morte, reagirem poderosamente sobre o estado do
Espírito nos primeiros momentos.
–
Idem outubro de 1860, O Despertar do Espírito:
Trecho da mensagem do Espírito chamado Georges:
Quando o homem
abandona os despojos mortais, experimenta um espanto e um deslumbramento que o
deixam por algum tempo indeciso quanto ao seu estado real; não sabe se está
morto ou vivo e suas sensações, muito confusas, demoram bastante para
aclarar-se. Pouco a pouco, os olhos do Espírito ficam deslumbrados por diversas
claridades que o cercam e ele acompanha toda uma ordem de coisas, grandes e
desconhecidas, que de início tem dificuldade em compreender, mas em breve
reconhece que não passa de um ser impalpável e imaterial; procura seus despojos
e se surpreende de não os encontrar; passa-se algum tempo antes que lhe venha a
memória do passado e o convença de sua identidade. Olhando a Terra, que acaba
de deixar, vê os parentes e amigos que o pranteiam, como vê o corpo inerte.
Finalmente seus olhos se destacam da Terra e se elevam para o Céu; se a vontade
de Deus não o retém no solo, ele sobe lentamente e se sente flutuar no espaço,
o que é uma sensação deliciosa. Então a lembrança da vida que deixa lhe aparece
com uma clareza às mais das vezes desoladora, mas outras vezes consoladora.
–
Idem maio 1862, Exéquias do sr. Sanson:
O
Sr. Sanson, faleceu no dia 21 de abril de 1862, depois de mais de um ano de
cruéis sofrimentos. Na previsão de sua morte, dirigira, no dia 27 de agosto de
1860, à Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, solicitando evocar o seu
Espírito imediatamente após a sua morte. Abaixo transcrevemos um questionamento
(número 3) e a resposta da evocação feita a ele, já como Espírito desencarnado,
inscrita neste número da Revista Espírita:
Estáveis
tão sofredor que podemos, penso, vos perguntar como estais agora. Sentis ainda
as vossas dores? Que sensação sentis, comparando a vossa situação presente com
a de há dois dias?
- R. Minha
posição é muito feliz, porque não sinto mais nada de minhas antigas dores;
estou regenerado de modo a tornar-me novo, como dizeis entre vós. A transição
da vida terrestre para a vida dos Espíritos tornou, de início, tudo
incompreensível, porque ficamos, às vezes, levamos dias para recobrar a nossa
lucidez; mas, antes de morrer, fiz uma prece a Deus para pedir-lhe poder falar
àqueles a quem amo, e Deus me escutou.
(3)
Ver nosso estudo com base in O Livro dos Espíritos, livro
segundo, cap. 1, questões de 93 à 95. Obra codificada por Allan Kardec.
http://www.aeradoespirito.net/EstudosEM/PERISPIRITO.html
(4)
Ver Allan
Kardec, O
Livro dos Espíritos, Livro Segundo, Perturbação Espírita, item 165.
O
conhecimento do Espiritismo exerce alguma influência sobre a duração maior ou
menor da perturbação?
-- Uma grande
influência, pois o Espírito compreende antecipadamente a sua situação: mas a
prática do bem e a pureza de consciência são o que exerce maior influência.
Observação de A.
Kardec: No
momento da morte, tudo, a princípio, é confuso; a alma necessita de algum tempo
para se reconhecer; sente-se como atordoada, no mesmo estado de um homem que
saísse de um sono profundo e procurasse compreender a situação. A lucidez das
ideias e a memória do passado voltam, a medida que se extingue a influência da
matéria e que se dissipa essa espécie de nevoeiro que lhe turva os pensamentos.
A
duração da perturbação de após morte é muito variável: pode ser de algumas
horas, como de muitos meses e mesmo de muitos anos. Aqueles em que é menos
longa, são os que se identificaram durante a vida com o seu estado futuro,
porque então compreendem imediatamente a sua posição.
Essa
perturbação apresenta circunstâncias particulares, segundo o caráter dos
indivíduos e sobretudo de acordo com o gênero de morte. Nas mortes violentas,
por suicídio, suplício, acidente, apoplexia, ferimentos, etc., o Espírito é
surpreendido, espanta-se, não acredita que esteja morto e sustenta teimosamente
que não morreu. Não obstante, vê o seu corpo, sabe que é dele, mas não
compreende que esteja separado. Procura as pessoas de sua afeição, dirige-se a
elas e não entende por que não o ouvem. Esta ilusão se mantém até o completo
desprendimento do Espírito, e somente então ele reconhece o seu estado e
compreende que não faz mais parte do mundo dos vivos.
Esse
fenômeno é facilmente explicável. Surpreendido pela morte imprevista, o
Espírito fica aturdido com a brusca mudança que nele se opera. Para ele, a
morte é ainda sinônimo de destruição, de aniquilamento; ora, como continua a
pensar, como ainda vê e escuta, não se considera morto. E o que aumenta a sua
ilusão é o fato de se ver num corpo semelhante ao que deixou na Terra, cuja
natureza etérea ainda não teve tempo de verificar. Ele o julga sólido e
compacto como o primeiro, e quando se chama a sua atenção para esse ponto,
admira-se de não poder apalpá-lo.
Assemelha-se
este fenômeno ao dos sonâmbulos inexperientes, que não creem estar dormindo.
Para eles, o sono é sinônimo de suspensão das faculdades; ora, como pensam
livremente e podem ver, não acham que estejam dormindo. Alguns Espíritos
apresentam esta particularidade, embora a morte não os tenha colhido
inopinadamente; mas ela é sempre mais generalizada entre os que, apesar de
doentes, não pensavam em morrer. Vê-se então o espetáculo singular de um
Espírito que assiste os próprios funerais como os de um estranho, deles falando
como de uma coisa que não lhe dissesse respeito, até o momento de compreender a
verdade.
A
perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem: é
calma e em tudo semelhante à que acompanha um despertar tranquilo. Para aquele
cuja consciência não está pura é cheia de ansiedades e angústias.
Nos
casos de morte coletiva observou-se que todos os que perecem ao mesmo tempo nem
sempre se reveem imediatamente. Na perturbação que se segue à morte cada um vai
para o seu lado ou somente se preocupa com aqueles que lhe interessam.
Ver
mais in Allan Kardec, Revista Espírita
- O suicida da Samaritana, junho de 1858,
- Um Espírito nos
Funerais de seu Corpo, dezembro de 1858.
- O Zuavo de Magenta, julho de 1859
- Um Espírito que não se crê morto, dezembro de 1859.
- François Simon Louvet, março de 1863
(5)
Erraticidade
–
estado dos Espíritos errantes, isto é, não encarnados, durante os intervalos de
suas diversas existências corpóreas. A erraticidade não é um sinal
absoluto de inferioridade para os Espíritos. Há Espíritos errantes de todas as
classes, salvo os da primeira ordem ou puros espíritos, que não tendo mais que
sofrer encarnação, não podem ser considerados como errantes. Os Espíritos
errantes são felizes ou desgraçados segundo o grau de sua purificação. É nesse
estado que o Espírito, tendo despido o véu material do corpo, reconhece suas
existências anteriores e os erros que o afastam da perfeição e da felicidade
infinita. É então, igualmente, que ele escolhe novas provas, a fim de avançar
mais depressa. (*) Allan Kardec, Instruções Práticas sobre as Manifestações
Espíritas, Vocabulário Espírita.
(*)
Erraticidade: Situação dos Espíritos errantes, quer dizer não
encarnados, durante os intervalos de suas existências corporais. (Ver Allan
Kardec, O Livro dos Espíritos, Livro segundo, Cap. VI, Espíritos
Errantes e O Livro dos Médiuns, cap. XXXII)
(6) Ver Allan Kardec, Revista Espírita:
- Relação Afetuosa
dos Espíritos, novembro de 1860.
- Relações Amigas
Entre Vivos e Mortos, maio de 1862..
(7)
Allan Kardec em nota diz que nas comunicações
espíritas, o Espírito de uma criança pode, pois, falar como o de um adulto,
porque pode ser um Espírito muito avançado. Se toma, algumas vezes, a linguagem
infantil é para não tirar da mãe o encanto de um ser frágil e delicado e
enfeitado com as graças da inocência. (Ver na Revista Espírita de
janeiro de 1858, em evocações particulares: Mamãe,
aqui estou!).
(8)
Ver Allan Kardec, Revista Espírita:
- A rainha de Oude, março de 1858.
- O Espírito e os herdeiros, maio de 1858.
- O tambor da Béresina, julho 1858.
- Um antigo carreteiro, dezembro de
1859
- Progresso dos Espíritos, outubro de 1860.
- Progresso de um Espírito perverso, abril de 1861.
(9) Ver nosso estudo sobre Idiotismo e loucura, com base nas
qq. de 371 à 378 de O Livro dos Espíritos, obra codificada por Allan Kardec.
(10)
Fatalidade
- A
fatalidade existe apenas na escolha que o Espírito fez ao encarnar e suportar
esta ou aquela prova. E da escolha resulta uma espécie de destino, que é a
própria consequência da posição que ele próprio escolheu e em que se acha.
Falamos das provas de natureza física, porque, quanto às de natureza moral e às
tentações, o Espírito, ao conservar seu livre-arbítrio quanto ao bem e ao mal,
é sempre senhor para ceder ou resistir. (ver Allan Kardec, O Livro dos
Espíritos, Livro terceiro, cap. X, Fatalidade, questão 851 e
seguintes).
Todas
as leis que regem o conjunto dos fenômenos da Natureza têm consequências
necessariamente fatais, quer dizer, inevitáveis, e esta fatalidade é
indispensável à manutenção da harmonia universal. O homem, que sofre essas
consequências, está, pois, em certos aspectos, submetido à fatalidade em tudo o
que não depende de sua iniciativa; assim, por exemplo, ele deve fatalmente
morrer: é a lei comum à qual não pode se subtrair, e, em virtude desta lei,
pode morrer em toda idade, quando sua hora é chegada; mas se ele apressa
voluntariamente a sua morte pelo suicídio ou por seus excessos, ele age em
virtude de seu livre-arbítrio, porque ninguém o pode constranger a fazê-lo. Ele
deve comer para viver: é da fatalidade; mas se come além do necessário, pratica
ato de liberdade. – Ver Allan Kardec, Revista Espírita, julho
1868, no artigo A Ciência da Concordância dos Números e a Fatalidade.)
(11) Ver nosso estudo sobre a Sorte das Crianças Após a Morte,
com base nas qq. de 197 à 199a de O Livro dos Espíritos, obra
codificada por Allan Kardec.
(12)
Ver Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Livro Segundo,
Ocupações e missões dos Espíritos, cap. X, item 558 e seguintes.
(13)
Ver Allan
Kardec, O
Livro dos Espíritos, Livro Segundo, Percepções, sensações e
sofrimento dos Espíritos - Idem, Livro Quarto: Esperanças e consolações;
penas e gozos futuros.
Ver também na coleção da Revista
Espírita:
- O assassino Lemaire, março de 1858
- O suicida da Samaritaine, junho de 1858
- Sensações dos Espíritos, dezembro de 1858
- O pai Crépin (César), junho de 1859
- Estelle Régnier (ou Riquier), fevereiro de 1860
- O suicida da rua Quincampoix, agosto de 1860
- O castigo, outubro
de 1860
- Entrada de um culpado no mundo dos Espírito, dezembro 1860
- Castigo do egoísta, dezembro 1860
- Suicídio de um ateu, fevereiro de 1861
- A pena de talião, setembro de 1861
(14) Ver Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Livro terceiro,
cap. II, Da Prece, item, 664 e Revista
Espírita, Efeitos da prece sobre os Espíritos sofredores, dezembro
de 1859.
(15)
Ver Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Livro Segundo,
Ocupações e missões dos Espíritos, cap. X, item 558 e seguintes.
Ver também na coleção da Revista
Espírita:
- Os puros
Espíritos,
outubro de 1860
- Morada dos
bem-aventurados, outubro de 1860
- Madame (Sra. Anís) Gourdon, junho 1861.
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