sexta-feira, 30 de novembro de 2012

ESCOLHA DAS PROVAS


ESCOLHA DAS PROVAS
Estudo com base no Livro segundo, de O Livro dos Espíritos,
Mundo Espírita ou dos Espíritos, cap. IV, subcapítulo V, Vida Espírita, questões de 258 à 273.
 Obra codificada por Allan Kardec
Pesquisa: Elio Mollo


No estado errante (1), antes de nova existência corpórea, o Espírito escolhe o gênero de provas (2) que deseja sofrer; nisto consiste o seu livre arbítrio (3), porém, nada acontece sem a permissão de Deus, porque foi Ele quem estabeleceu todas as leis que regem o universo. Sendo assim, podemos nos perguntar por que Ele fez tal lei em vez de tal outra! Ora, dando ao Espírito a liberdade de escolha, deixa-lhe toda a responsabilidade dos seus atos e das suas consequências; nada lhe estorva o futuro; o caminho do bem está à sua frente, como o do mal. Mas se sucumbir, ainda lhe resta uma consolação, a de que nem tudo se acabou para ele, pois Deus, na sua bondade, permite-lhe recomeçar o que foi mal feito. Por isso, é necessário distinguir o que é obra da vontade de Deus e o que é da vontade do homem. Se um perigo nos ameaça, e não fomos nós que o criamos, mas Deus, contudo, tivemos a vontade de nos expormos a ele, porque o consideramos um aprendizado, um meio de adiantamento; e assim Deus o permitiu.

Quando dizemos que o Espírito escolhe o gênero de provas que deve sofrer, e que “todas” as tribulações da vida foram previstas e escolhidas por ele (nós), devemos entender que “todas”, não é bem o termo, pois não se pode dizer que escolhemos e previmos tudo o que nos acontece no mundo (4), até as menores coisas. Escolhemos o gênero de provas, mas os detalhes são consequências da posição escolhida, e frequentemente de nossas próprias ações. Se o Espírito desejou nascer entre malfeitores, por exemplo, já sabia a que deslize se expunha, mas não conhecia cada um dos atos que praticaria; esses atos são produtos de sua vontade ou do seu livre arbítrio: O Espírito sabe que, escolhendo esse caminho, terá de passar por esse gênero de lutas; e sabe de que natureza são as vicissitudes que irá encontrar; mas não sabe quais os acontecimentos que o aguardam. Os detalhes nascem das circunstâncias e da força das coisas. Só os grandes acontecimentos, que influem no destino, estão previstos. Se tomamos um caminho cheio de desvios, sabemos que devemos ter muitas precauções, porque corremos o perigo de cair, mas não sabemos quando cairemos, e pode ser que nem caiamos, se formos bastante prudentes. Se ao passar pela rua uma telha nos cair na cabeça, não devemos pensar que estava escrito, como vulgarmente se diz.

Podemos nos perguntar, como o Espírito pode querer nascer entre gente de má vida? Ora, é necessário ser enviado ao meio em que possa sofrer a prova solicitada. O semelhante atrai o semelhante, e para lutar contra o instinto do banditismo é preciso que ele se encontre entre gente dessa espécie. Num mundo superior onde o mal não tem acesso, essas situações não acontecem(riam), pois nele, só existem bons Espíritos. É o que devemos fazer na Terra: que o bem prevaleça e não haja necessidade de sofrermos esses tipos de provas.

O Espírito, nas provas que deve sofrer para chegar à perfeição, certamente não terá de experimentar todos os gêneros de tentações nem deverá passar por todas as circunstâncias que possam provocar-lhe o orgulho, o ciúme, a avareza, a sensualidade, etc., pois há os que tomam, desde o princípio, um bom caminho que os afasta de muitas provas. Mas aquele que se deixa levar pelo mau caminho corre todos os perigos do mesmo. Um Espírito pode pedir a riqueza e esta lhe ser dada; então, segundo o seu caráter, poderá tornar-se avarento ou pródigo, egoísta ou generoso, ou ainda entregar-se a todos os prazeres da sensualidade. Mas isso não quer dizer que ele devia cair forçosamente em todas essas tendências.

O Espírito, que em sua origem é simples, ignorante e sem experiência de escolher uma existência com conhecimento de causa, Deus supre a sua inexperiência, traçando-lhe o caminho que deve seguir como fazes com uma criança desde o berço. Mas deixa-lhe pouco a pouco a liberdade de escolher, à medida que o seu livre arbítrio se desenvolve. É então que ele muitas vezes se extravia, tomando o mau caminho, por não ouvir os conselhos dos bons Espíritos (5). E a isso que podemos chamar a queda do homem. Deus sabe esperar: não precipita a expiação (6). Entretanto pode impor certa existência a um Espírito, quando este, por sua inferioridade ou má vontade, não está apto a compreender o que lhe seria mais proveitoso, e quando vê que essa existência pode servir para a sua purificação, o seu adiantamento, e ao mesmo tempo servir-lhe de expiação.

O Espírito não faz a sua escolha imediatamente após a morte, pois muitos creem na eternidade das penas (7), e como já nos foi dito, isso é um castigo.

O que orienta o Espírito na escolha das provas é as que lhe podem servir de expiação, segundo a natureza de suas faltas, e fazê-lo adiantar mais rapidamente. Uns podem impor-se uma vida de misérias e privações, para tentar suportá-la com coragem; outros, experimentar as tentações da fortuna e do poder, bem mais perigosas pelo abuso e o mau emprego que lhes pode dar e pelas más paixões que desenvolvem; outros, enfim, querem ser provados nas lutas que terão de sustentar no contato com o vício.

Há Espíritos que escolhem o contato com o vício, como prova, há os que o escolhem por simpatia e pelo desejo de viver num meio adequado aos seus gostos, ou para poderem entregar-se livremente às suas inclinações materiais, mas só entre aqueles cujo senso moral é ainda pouco desenvolvido; a prova decorre disso, e eles a sofrem por tempo mais longo. Cedo ou tarde compreenderão que a satisfação das paixões brutais tem para eles consequências deploráveis, que terão de sofrer durante um tempo que lhes parecerá eterno. Deus poderá deixá-los nesse estado até que eles tenham compreendido suas faltas, pedindo por si mesmos o meio de resgatá-las em provas proveitosas.

Pode nos parecer natural que os Espíritos escolham as provas menos penosas, mas para o Espírito, não. Quando ele está liberto da matéria, cessa a ilusão, e a sua maneira de pensar é diferente. O homem, submetido na Terra à influência das ideias carnais, só vê nas suas provas o lado penoso. E por isso que lhe parece natural escolher as que, do seu ponto de vista, podem subsistir com os prazeres materiais. Mas na vida espiritual ele compara os prazeres fugitivos e grosseiros com a felicidade inalterável que entrevê, e então que lhe importam alguns sofrimentos passageiros. O Espírito pode escolher a prova mais rude e em consequência a existência mais penosa, com a esperança de chegar mais depressa a um estado melhor, como o doente escolhe muitas vezes o remédio mais desagradável para se curar mais rapidamente. Aquele que deseja ligar o seu nome à descoberta de um país desconhecido não escolhe um caminho coberto de flores, pois sabe os perigos que corre, mas sabe também a glória que o espera, se for feliz.

A doutrina da liberdade de escolha das nossas existências, e das provas que devemos sofrer, deixa de parecer estranha. Quando consideramos que os Espíritos, libertos da matéria, apreciam as coisas de maneira diferente da nossa. Eles anteveem o fim, e esse fim lhes parece muito mais importante que os prazeres fugitivos do mundo. Depois de cada existência, veem o progresso que fizeram e compreendem quanto ainda lhes falta em pureza para o atingirem. Eis porque se submetem voluntariamente a todas as vicissitudes da vida corpórea, pedindo eles mesmos aquelas que podem fazê-los chegar mais depressa. Não há pois, motivo para nos admirarmos de ver o Espírito não dar preferência à existência mais suave. No seu estado de imperfeição, ele não pode desfrutar a vida sem amarguras, que apenas entrevê; e é para atingi-la que procura melhorar-se.

Não vemos diariamente exemplos de coisas parecidas? O homem que trabalha uma parte de sua vida, sem tréguas nem descanso, a fim de ajuntar o necessário para o seu bem-estar não desempenha uma tarefa que se impôs, com vistas a um futuro melhor? O militar que se oferece para uma missão perigosa, o viajante que não enfrenta menores perigos, no interesse da Ciência ou de sua própria fortuna, não se submetem a provas voluntárias, que devem proporcionar-lhes honra e proveito, se as vencerem? A que o homem não se expõe, pelo seu interesse ou pela sua glória? Todos os concursos não são provas voluntárias para melhorar na carreira escolhida? Não se chega a nenhuma posição social de elevada importância, nas Ciências, nas artes, na indústria, sem passar pela série de posições inferiores, que são outras tantas provas. A vida humana é assim o decalque da vida espiritual. Nela encontramos em menor escala todas as peripécias daquela. Se na vida terrena escolhemos muitas vezes as provas mais difíceis, com vistas a um fim mais elevado, por que o Espírito, que vê mais longe, e para quem a vida do corpo é apenas um incidente fugitivo, não escolherá uma existência penosa e laboriosa, se ela o deve conduzir a uma felicidade eterna? Aqueles que dizem que se pudessem escolher a sua existência teriam pedido a de príncipes ou milionários, são como os míopes que não veem o que tocam, ou como as crianças gulosas que respondem, quando perguntamos que profissão preferem: pasteleiros ou confeiteiros.

Da mesma maneira, o viajante no fundo de um vale nevoento, não pode ver a extensão nem os pontos extremos da sua rota; mas, chegando ao cume da montanha, seu olhar abrange o caminho percorrido e o que falta a percorrer, vê o final de sua viagem, os obstáculos que ainda tem de vencer, e pode então escolher com mais segurança os meios de o atingir. O Espírito encarnado é como o viajante no fundo do vale; desembaraçado dos liames terrestres, é como o que atingiu o cume. Para o viajante, o fim é o repouso após a fadiga para o Espírito, é a felicidade suprema, após as tribulações e as provas.

Todos os Espíritos dizem que, no estado errante, buscam, estudam, observam, para fazerem suas escolhas. Não temos um exemplo disso na vida corpórea? Não buscamos muitas vezes através dos anos a carreira que livremente acabamos por escolher, porque a achamos a mais apropriada aos nossos objetivos? Se fracassamos numa, procuramos outra. Cada carreira que abraçamos é uma fase, um período de vida: Não empregamos cada dia em escolher o que faremos no outro? Ora, o que são as diferentes existências corpóreas, para o Espírito, senão fases, períodos, dias da sua vida espírita, que, como o sabemos, é a vida normal, não sendo a vida corporal mais o que transitória, passageira?

O Espírito pode fazer a sua escolha durante a vida corporal, seu desejo pode ter influência. Isso depende da intenção. Mas, é no estado de Espírito que frequentemente vê as coisas de maneira bem diversa. É o Espírito quem faz a escolha. Mas, ainda assim, ele pode fazê-la nesta vida material, porque o Espírito tem sempre os momentos em que se liberta da matéria.

Sem dúvida, existem muitas pessoas que desejam grandezas e riquezas, mas não como expiação nem como prova, contudo, se a matéria deseja essa grandeza para gozá-la, o Espírito a deseja para conhecer-lhe as vicissitudes.

Até que chegue ao estado de perfeita pureza, o Espírito tem de passar constantemente por provas, mas elas não são como as entendemos. Chamamos provas às tribulações materiais; ora, o Espírito, chegado a um certo grau, mesmo sem ser perfeito, não tem mais nada a sofrer. Mas tem sempre deveres que o ajudam a se aperfeiçoar, e que não são penosos para ele, a não ser os de ajudar os outros a se aperfeiçoarem (8).

O Espírito pode enganar-se quanto à eficácia da prova que escolher, pois pode escolher uma que esteja acima das suas forças, e então sucumbe. Pode também escolher uma que não lhe dê proveito algum, como um gênero de vida ociosa e inútil. Mas, nesse caso, voltando ao mundo dos Espíritos, percebe que nada ganhou e pede para recuperar o tempo perdido.

As vocações de certas pessoas e sua vontade de seguir uma carreira em vez de outra é a consequência de tudo o que dissemos até aqui sobre a escolha das provas e sobre o progresso realizado numa existência anterior.

Quando o Espírito estuda, na erraticidade, as diversas condições em que poderá progredir, os Espíritos mais adiantados não escolhem nascer entre os canibais, mas os Espíritos da mesma natureza dos canibais, ou que lhes são inferiores.

Sabemos que os nossos antropófagos não estão no último grau da escala, e que há mundos onde o embrutecimento e a ferocidade ultrapassam tudo que existe na Terra. Esses Espíritos são, portanto, ainda inferiores aos mais inferiores do nosso mundo, e vir para o meio dos nossos selvagens é para eles um progresso, como seria um progresso para os nossos antropófagos exercer entre nós uma profissão que não os obrigasse a derramar sangue. Se eles não visam a mais alto, é porque a sua inferioridade moral não lhes permite compreender um progresso mais completo. O Espírito não pode avançar senão gradualmente; não pode transpor de um salto a distância que separa a barbárie da civilização. E está nisso uma necessidade da reencarnação, que se mostra verdadeiramente de acordo com a justiça de Deus. De outra maneira, em que se transformariam esses milhões de seres que morrem diariamente no último estado de degradação, se não tivessem meios de se elevar? Por que Deus os teria deserdado dos favores concedidos aos demais?

Os Espíritos procedentes dum mundo inferior à Terra, ou dum mundo muito atrasado, como os canibais, poderiam nascer entre os povos civilizados, há os que se extraviam, ao quererem subir muito alto; mas ficam deslocados entre nós, porque têm hábitos e instintos que se chocam com os nossos. Esses seres nos dão o triste espetáculo da ferocidade em meio da civilização. Retornando para o meio dos canibais, isso não será um retrocesso, pois não farão mais do que retomar o seu lugar, e talvez ainda com proveito.

Um homem pertencente a uma raça civilizada poderia, por expiação, reencarnar-se numa raça selvagem, mas isso depende do gênero da expiação. Um senhor que tenha sido duro para os seus escravos poderá tornar-se escravo e sofrer os maus tratos que infligiu a outros. Aquele que mandou numa época, pode, em outra existência, obedecer aos que se curvaram ante a sua vontade. É uma expiação, se ele abusou do poder e Deus pode determiná-la. Um bom Espírito pode, para os fazer avançar, escolher uma vida de influência entre esses povos. Então se trata de uma missão. 
  
NOTAS:
(1) Erraticidade – estado dos Espíritos errantes, isto é, não encarnados, durante os intervalos de suas diversas existências corpóreas. A erraticidade não é um sinal absoluto de inferioridade para os Espíritos. Há Espíritos errantes de todas as classes, salvo os da primeira ordem ou puros espíritos, que não tendo mais que sofrer encarnação, não podem ser considerados como errantes. Os Espíritos errantes são felizes ou desgraçados segundo o grau de sua purificação. É nesse estado que o Espírito, tendo despido o véu material do corpo, reconhece suas existências anteriores e os erros que o afastam da perfeição e da felicidade infinita. É então, igualmente, que ele escolhe novas provas, a fim de avançar mais depressa. (Allan Kardec in Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas, Vocabulário.)

(2) Provas – vicissitudes da vida corporal pelas quais os Espíritos se purificam segundo a maneira pela qual as suportam. Segundo a doutrina espírita, o Espírito desprendido do corpo, reconhecendo sua imperfeição, escolhe ele próprio, por ato de seu livre arbítrio, o gênero de provas que julga mais próprio ao seu adiantamento e que sofrerá em sua nova existência. Se ele escolhe uma prova acima de suas forças, sucumbe, e seu adiantamento retarda. (Allan Kardec in Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas, Vocabulário.)

(3) Livre arbítrio – liberdade moral do homem; faculdade que ele tem de se guiar pela sua vontade na realização de seus atos. Os Espíritos nos ensinam que a alteração das faculdades mentais, por uma causa acidental ou natural, é o único caso em que o homem fica privado de seu livre arbítrio. Fora disto é sempre senhor de fazer ou de não fazer. Ele goza desta liberdade no estado de Espírito, e é em virtude desta faculdade que escolhe livremente a existência e as provas que julga próprias para seu progresso; ele a conserva no estado corporal, a fim de poder lutar contra essas mesmas provas. Os Espíritos que ensinam esta doutrina não podem ser maus Espíritos. (Allan Kardec in Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas, Vocabulário.)

(4) A fatalidade não existe senão para a escolha feita pelo Espírito, ao encarnar-se, de sofrer esta ou aquela prova; ao escolhê-la, ele traça para si mesmo uma espécie de destino, que é a própria consequência da posição em que se encontra. Falo das provas de natureza física, porque, no tocante às provas morais e às tentações, o Espírito, conservando o seu livre arbítrio sobre o bem e o mal, é sempre senhor de ceder ou resistir. Um bom Espírito, ao vê-lo fraquejar, pode correr em seu auxílio mas não pode influir sobre ele a ponto de subjugar lhe a vontade. Um Espírito mau, ou seja, inferior, ao lhe mostrar ou exagerar um perigo físico pode abalá-lo e assustá-lo, mas a vontade do Espírito encarnado não fica por isso menos livre de qualquer entrave. (Resposta dos Espíritos superiores a questão 851 de O Livro dos Espíritos, obra codificada por Allan Kardec.)

(5) Os Espíritos exercem influência sobre os acontecimentos da vida, nos aconselhando através do pensamento, mas não agem nunca fora das leis naturais. (Resposta dos Espíritos superiores a questão 525 de O Livro dos Espíritos, obra codificada por Allan Kardec.)

Pensamos erradamente que a ação dos Espíritos só deve manifestar-se por fenômenos extraordinários; desejaríamos que viessem em nosso auxílio através de milagres e sempre os representamos armados de uma varinha mágica. Mas assim não é, e eis porque a sua intervenção nos parece oculta, e o que se faz pelo seu concurso nos parece inteiramente natural. Assim, por exemplo, eles provocarão o encontro de duas pessoas, o que parece dar-se por acaso; inspirarão a alguém o pensamento de passar por tal lugar; chamarão sua atenção para determinado ponto, se isso pode conduzir ao resultado que desejam; de tal maneira que o homem, não julgando seguir senão os seus próprios impulsos, conserva sempre o seu livre arbítrio. (Nota de Allan Kardec em relação as respostas as questões 525 e 525a de O Livro dos Espíritos).

(6) Expiação – pena que sofrem os Espíritos como punição das faltas cometidas durante a vida corporal. A expiação, sofrimento moral, ocorre no estado de erraticidade como o sofrimento físico ocorre no estado corporal. As vicissitudes e os tormentos da vida corporal são, ao mesmo tempo, provas para o futuro e expiação do passado. (Allan Kardec in Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas, Vocabulário.)

(7) Penas eternas – os Espíritos superiores nos ensinam que só o bem é eterno, porque é a essência de Deus, e que o mal terá um fim. Por consequência deste princípio, combatem a doutrina da eternidade das penas como contrária à ideia que Deus nos dá de sua justiça e de sua bondade. Mas a luz não se faz para os Espíritos senão proporcionalmente à sua elevação: nas classes inferiores suas ideias são ainda obscurecidas pela matéria; o futuro para eles está coberto por um véu. Não veem senão o presente. Estão na posição de um homem que sobe uma montanha: no fundo do vale a neblina e as voltas do caminho limitam-lhe a vista; é-lhe preciso chegar ao cimo para descortinar todo o horizonte, avaliar o caminho que fez e o que lhe resta fazer. Os Espíritos imperfeitos, não divisando o termo de seus sofrimentos, julgam sofrer sempre, e esse pensamento mesmo é um castigo para eles. Se, pois, certos Espíritos nos falam de penas eternas, é porque eles próprios creem nelas em consequência de sua inferioridade. (Allan Kardec in Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas, Vocabulário.)

(8) ...o Espírito, qualquer que seja o seu grau de adiantamento, sua situação como reencarnado ou na erraticidade, está sempre colocado entre um superior que o guia e aperfeiçoa e um inferior perante o qual tem deveres iguais a cumprir. (Resposta do Espírito São Vicente de Paulo a questão 888a de O Livro dos Espíritos, obra codificada por Allan Kardec.)
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quinta-feira, 29 de novembro de 2012

PERCEPÇÕES SENSAÇÕES E SOFRIMENTOS DOS ESPÍRITOS.


PERCEPÇÕES SENSAÇÕES
E SOFRIMENTOS DOS ESPÍRITOS.
Estudo com base in O LIVRO DOS ESPÍRITOS
Livro Segundo, qq. de  237 à 256
Mundo Espírita ou dos Espíritos, Capítulo VI, Vida Espírita
Obra codificada por Allan Kardec
Pesquisa: Elio Mollo


A alma, uma vez no mundo dos Espíritos, tem ainda as percepções (1) que tinha nesta vida e outras que não possuía, porque o seu corpo era como um véu que a obscurecia. A inteligência é um atributo do Espírito (2), mas se manifesta mais livremente no mundo dos Espíritos quando não tem entraves.

As percepções e os conhecimentos dos Espíritos quanto mais se aproximam da perfeição mais sabem: se são superiores, sabem muito. Os Espíritos inferiores são mais ou menos ignorantes em todos os assuntos.

O conhecimento dos Espíritos em relação ao princípio das coisas se faz conforme a sua elevação e a sua pureza. Os Espíritos inferiores não sabem mais do que os homens.

Os Espíritos não compreendem a duração do tempo como nós e isso faz que nem sempre os compreendamos, quando se trata de fixar datas ou épocas. (3)

Os Espíritos vivem fora do tempo, tal como o compreendemos. A duração, para eles, praticamente não existe, e os séculos, tão longos para nós, não são aos seus olhos mais do que instantes que desaparecem na eternidade, da mesma maneira que as desigualdades do solo se apagam e desaparecem para aquele que se eleva no espaço.

Os Espíritos fazem do presente uma ideia mais ou menos justa como aquele que vê claramente e tem uma ideia mais justa das coisas, do que o cego. Os Espíritos vêem o que não vemos, e julgam diferentes de nós. Mas isso depende da sua elevação.

O passado para os Espíritos, é um presente, precisamente como a lembrança de uma coisa que os impressionou durante a encarnação. Entretanto, como não têm mais o véu material que obscurece a sua inteligência, lembram-se das coisas que desapareceram para nós. Mas nem tudo os Espíritos conhecem (4), a começar pela sua própria criação.

Os Espíritos tem conhecimento do futuro conforme o progresso espiritual que atingiram, ou melhor, quase sempre, nada mais fazem do que entrevê-lo, mas nem sempre têm a permissão de o revelar. Quando o veem, ele lhes parece presente. O Espírito vê o futuro mais claramente à medida que se aproxima de Deus. Depois da morte, a alma vê e abarca de relance as suas migrações passadas, mas não pode ver o que Deus lhe prepara. Para isso é necessário que esteja integrada nele, depois de muitas existências.

Quanto ao completo conhecimento do futuro, Deus é o único e soberano Senhor, e ninguém o pode igualar.

Somente os Espíritos superiores veem a Deus e o compreendem. Os Espíritos inferiores o sentem e adivinham. Quando um Espírito inferior diz que Deus lhe proíbe ou permite uma coisa, ele não vê a Deus, mas sente a sua soberania, e quando uma coisa não deve ser feita ou uma palavra não deve ser dita, ele o sente como uma intuição, uma advertência invisível que o inibe de fazê-lo. Nós, os encarnados, temos pressentimentos que são para nós como advertências secretas, intuição, para fazermos ou não alguma coisa. O mesmo acontece com os Espíritos, mas em grau superior, pois sendo mais sutil do que a dos encarnados a essência dos Espíritos, podem receber mais facilmente as advertências divinas.

A ordem transmitida por Deus, não lhe chega diretamente de Deus, pois para comunicar-se com Ele é preciso merecê-Lo. Deus transmite as suas ordens pelos Espíritos que estão mais elevados em perfeição e instrução. (5)

A vista dos Espíritos não é circunscrita como nos seres corpóreos, para eles é uma faculdade geral.

Os Espíritos veem pela luz própria, sem necessidade de luz exterior. Para eles não há trevas, a não ser aquelas em que podem encontrar-se por expiação. 

Quando os Espíritos precisam transportar-se para ver em dois lugares diferentes ao mesmo tempo, como o Espírito se transporta com a rapidez do pensamento, podemos dizer que vê por toda parte de uma só vez. Seu pensamento pode irradiar e dirigir-se para muitos pontos ao mesmo tempo (6). Mas essa faculdade depende da sua pureza. Quanto menos puro ele for, mais limitada é a sua vista. Somente os Espíritos superiores podem ter visão de conjunto.

A faculdade de ver dos Espíritos, inerente à sua natureza, difunde-se por todo o seu ser, como a luz num corpo luminoso. E uma espécie de lucidez universal, que se estende a tudo, envolve simultaneamente o espaço, o tempo e as coisas, e para a qual não há trevas nem obstáculos materiais. Compreendendo-se que assim deve ser, pois no homem a vista funciona através de um órgão que recebe a luz, e sem luz ele fica na obscuridade. Mas, nos Espíritos, a faculdade de ver sendo um atributo próprio que independe de qualquer agente exterior, a vista não precisa de luz.

O Espírito vê as coisas mais distintamente do que os encarnados, porque a sua vista nada a obscurece.

O Espírito percebe os sons mais do que nos os encarnados, até mesmo os que os nossos sentidos obtusos não podem perceber.  Todas as percepções são atributos do Espírito e fazem parte do seu ser. Quando ele se reveste do corpo material, eles se manifestam pelos meios orgânicos; mas, no estado de liberdade, não estão mais localizadas.

O Espírito só vê e ouve o que ele quiser. Isto de uma maneira geral, e sobretudo para os Espíritos elevados, porque os imperfeitos ouvem e veem frequentemente, queiram ou não, aquilo que pode ser útil ao seu melhoramento.

A nossa música em relação a música celeste, uma é para a outra o que o canto do selvagem é para a suave melodia. Não obstante os Espíritos vulgares podem provar um certo prazer ao ouvir a nossa música terrestre porque não estão ainda capazes de compreender outra mais sublime. A música tem, para os Espíritos, encantos infinitos, em razão de suas qualidades sensitivas muito desenvolvidas. Refiro-me à música celeste, que é tudo quanto a imaginação espiritual pode conceber de mais belo e mais suave. 

As belezas naturais dos vários globos são tão diversas que estamos longe de as conhecer, mas os Espíritos são sensíveis a elas, segundo as suas aptidões para as apreciar e as compreender. Para os Espíritos elevados há belezas de conjunto, diante das quais se apagam, por assim dizer, as belezas dos detalhes.

Os Espíritos conhecem as nossas necessidades e os nossos sofrimentos físicos, porque também os sofreram, mas não os experimentam materialmente como nós, porque são Espíritos.

Os Espíritos não podem sentir a fadiga como a entendemos, e portanto não necessitam do repouso corporal, pois não possuem órgãos em que as forças tenham de ser restauradas. Mas o Espírito repousa no sentido de não permanecer numa atividade constante. Ele não age de maneira material, porque a sua ação é toda intelectual e o seu repouso é todo moral. Há momentos em que o seu pensamento diminui de atividade e não se dirige a um objeto determinado; este é o verdadeiro repouso, mas não se pode compará-lo ao do corpo. A espécie de fadiga que os Espíritos podem provar está na razão da sua inferioridade, pois quanto mais se elevam, de menos repouso necessitam.

Quando um Espírito diz que sofre, a natureza do seu sofrimento é de angústias morais, que o torturam muito mais dolorosamente que os sofrimentos físicos.

Quando alguns Espíritos se queixam de frio ou calor, essa lembrança é do que sofreram durante a vida, e algumas vezes tão penosa como a própria realidade. Frequentemente é uma comparação que fazem, para exprimirem a sua situação. Quando se lembram do corpo experimentam uma espécie de impressão, como quando se tira uma capa e algum tempo depois ainda se pensa estar com ela.

NOTAS:

(1) Sobre as sensações e percepções do espírito Kardec in Revista Espírita - janeiro 1866 (A Jovem Cataléptica de Souabe), diz que: “A alma é o ser inteligente; nela está a sede de todas as percepções e de todas as sensações; sente e pensa por si mesma; é individual, distinta, perfectível, pré-existente e sobrevivente ao corpo.

(2) A inteligência é um atributo essencial do espírito, porém, ambos se confundem num princípio comum, de sorte que, para nós, parecem que são a mesma coisa. (LE - 24)

(3) Na Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita de O Livro dos Espíritos, encontramos o seguinte em relação ao pensamento para que entendamos melhor sobre a duração do tempo para os Espíritos: 
Item XIV da Introdução: “Livres da matéria, a linguagem de que usam entre si é rápida como o pensamento, porquanto são os próprios pensamentos que se comunicam sem intermediário.”

(4) Em Obras Póstumas, 2ª parte, Minha primeira iniciação no Espiritismo, Allan Kardec diz que: “Um dos primeiros resultados de minhas observações foi que os Espíritos, não sendo outros senão as almas dos homens, não tinham a soberana sabedoria, nem a soberana ciência; que o seu saber estava limitado ao grau de seu adiantamento, e que a sua opinião não tinha senão o valor de uma opinião pessoal. Essa verdade, reconhecida desde o princípio, me preservou do grande escolho de crer em sua infalibilidade, e me impediu de formular teorias prematuras sobre o dizer de um só ou de alguns.”

(5) No O Livro dos Espíritos questão 888ª, o Espírito Vicente de Paulo nos informa para que “Não esqueceis jamais que o Espírito, qualquer que seja o seu grau de adiantamento, sua situação como reencarnado ou na erraticidade, está sempre colocado entre um superior que o guia e aperfeiçoa e um inferior perante o qual tem deveres iguais a cumprir.”

(6) No O Livro dos Espíritos questão 92, e em O Livro dos Médiuns, 2ª parte, item 282, questão 30, encontramos as seguintes informações quanto a ubiquidade dos Espíritos:

Os Espíritos não tem o dom da ubiquidade, ou, em outras palavras, o mesmo Espírito não pode dividir-se ou estar ao mesmo tempo em vários pontos, pois não pode haver divisão de um Espírito, contudo cada um deles é um centro que irradia para diferentes lados, e é por isso que parecem estar em muitos lugares ao mesmo tempo. Vês o Sol, que não é mais do que um, e não obstante irradia por toda parte e envia os seus raios até muito longe. Apesar disso, ele não se divide. (LE – 92) 

Para responder, ao mesmo tempo, às perguntas que lhe são dirigidas, o Espírito se divide ou tem o dom da ubiquidade
R - O Sol é um só e, no entanto, irradia ao seu derredor, levando longe seus raios, sem se dividir. Do mesmo modo, os Espíritos. O pensamento do Espírito é como uma centelha que projeta longe a sua claridade e pode ser vista de todos os pontos do horizonte. Quanto mais puro é o Espírito tanto mais o seu pensamento se irradia e se estende, como a luz. Os Espíritos inferiores são muito materiais; não podem responder senão a uma única pessoa de cada vez, nem vir a um lugar, se são chamados em outro. 

Um Espírito superior, chamado ao mesmo tempo em pontos diferentes, responderá a ambas as evocações, se forem ambas sérias e fervorosas. No caso contrário, dá preferência à mais séria.
(O Livro dos Médiuns – 62ª. ed. – Allan Kardec (Guia dos Médiuns e dos Evocadores) (Paris - 1861), 2ª parte, item 282, questão 30)

Os Espíritos não irradiam com o mesmo poder, bem longe disso, o poder de irradiação depende do grau de pureza de cada um. (LE – 92a)  

Nota de Allan Kardec: Cada Espírito é uma unidade indivisível; mas cada um deles pode estender o seu pensamento em diversas direções, sem por isso se dividir. É somente nesse sentido que se deve entender o dom de ubiquidade atribuído aos Espíritos. Como uma fagulha que projeta ao longe a sua claridade e pode ser percebida de todos os pontos do horizonte. Como, dada, um homem que, sem mudar de lugar e sem se dividir, pode transmitir ordens, sinais e produzir movimentos em diferentes lugares.

Fontes:
Allan Kardec - O Livro dos Espíritos, cap. VI, questões de 237 à 256.
Allan Kardec - Revista Espírita - janeiro 1866 (A Jovem Cataléptica de Souabe).
Allan Kardec - O Livro dos Espíritos, Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, itens V, XIII e XIV.
Allan Kardec - Obras Póstumas, 2ª parte, Minha primeira iniciação no Espiritismo.
Allan Kardec - O Livro dos Espíritos, questão 888ª.
Allan Kardec - O Livro dos Espíritos, questão 92.
Allan Kardec - O Livro dos Médiuns 2ª parte, item 282, questão 30)

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sábado, 24 de novembro de 2012

PROVA, EXPIAÇÃO E DURAÇÃO DAS PENAS


PROVA, EXPIAÇÃO E DURAÇÃO DAS PENAS
Obras da pesquisa citadas no texto e nas notas.
Pesquisa: Elio Mollo
Atualizado em 07/05/2013


Encontramos em “Instruções práticas sobre as Manifestações Espíritas, obra de Allan Kardec, que “expiação é a pena que sofrem os Espíritos como punição das faltas cometidas durante a vida corporal. A expiação, sofrimento moral, ocorre no estado de erraticidade, como o sofrimento físico ocorre no estado corporal. As vicissitudes e os tormentos da vida corporal são ao mesmo tempo, provas para o futuro e expiação do passado.” Nessa mesma obra encontramos que as “provas são vicissitudes da vida corporal pelas quais os Espíritos se purificam segundo a maneira pela qual as suportam. Segundo a doutrina espírita, o Espírito desprendido do corpo, reconhecendo sua imperfeição, escolhe ele próprio, por ato de seu livre arbítrio, o gênero de provas que julga mais próprio ao seu adiantamento e que sofrerá em sua nova existência. Se ele escolhe uma prova acima de suas forças, sucumbe, e seu adiantamento e retardado.” (1)

O Espírito Emmanuel no livro “O Consolador”, respondendo a questão 246, disse que “a provação é a luta que ensina ao discípulo rebelde e preguiçoso a estrada do trabalho e da edificação espiritual. A expiação é a pena imposta ao malfeitor que comete um crime.” (2) (O grifo é nosso)

Na obra O Espiritismo na sua mais Simples Expressão”, Kardec disse queo Espírito culpado é punido pelos sofrimentos morais no mundo dos Espíritos, e pelas penas físicas na vida corpórea. Suas aflições são consequências de suas faltas, quer dizer, de sua infração à lei de Deus; de modo que constituem simultaneamente uma expiação do passado e uma prova para o futuro é assim que o orgulhoso pode ter uma existência de humilhação, o tirano uma vida de servidão; o rico mau uma encarnação de miséria.” (3) (O grifo é nosso)

Na Revista Espírita de setembro de 1863, Allan Kardec, respondendo a uma correspondência diz que "A expiação implica necessariamente a ideia de um castigo mais ou menos penoso, resultado de uma falta cometida; a prova implica sempre a de uma inferioridade real ou presumida, porque aquele que chegou ao ponto culminante, ao qual aspira, não tem mais necessidade de provas. Em certos casos, a prova se confunde com a expiação, quer dizer que a expiação pode servir de prova, e reciprocamente. O candidato que se apresenta para obter um grau, sofre uma prova; se fracassa, lhe é preciso recomeçar um trabalho penoso; esse novo trabalho é a punição da negligência levada no primeiro; a segunda prova torna-se assim uma expiação. Para o condenado a quem se faz esperar um abrandamento ou uma comutação conduzindo-se bem, a pena é, ao mesmo tempo, uma expiação por sua falta, e uma prova para a sua sorte futura; se, em sua saída da prisão, não estiver melhor, a prova é nula, e um novo castigo trará uma nova prova.

Se consideramos agora o homem sobre a Terra, vemos que ele aqui sofre males de todas as espécies e frequentemente cruéis; esses males têm uma causa; ora, a menos de atribuí-las ao capricho do Criador, é-se forçado a admitir que  essa  causa  está  em  nós mesmos, e que as misérias que experimentamos não podem ser o resultado de nossas virtudes; portanto, elas têm sua fonte em nossas imperfeições. Que um Espírito se encarne sobre a Terra no seio da fortuna, das honras e de todos os gozos materiais, poder-se-á dizer que sofre a prova do arrastamento; para aquele que cai na infelicidade por sua má conduta ou sua imprevidência, é a expiação de suas faltas atuais, e pode-se dizer que é punido por onde pecou. Mas que se dirá daquele que, desde seu nascimento, luta com as necessidades e as privações, que arrasta a existência miserável e sem esperança de melhoria, que sucumbe sob o peso de enfermidades congênitas, sem ter ostensivamente nada feito para merecer uma semelhante sorte? Que isso seja uma prova ou uma expiação, a sua posição não é menos penosa, e isso não seria mais equitativo do ponto de vista de nosso correspondente, uma vez que se o homem não se lembra da falta, não se lembra mais de ter escolhido a prova. É preciso, pois, procurar em outra parte a solução da questão.

Todo efeito tendo uma causa, as misérias humanas são efeitos que devem ter uma causa; se essa causa não está na vida atual, deve estar na vida anterior. Além disso, admitindo a justiça de Deus, esses efeitos devem ter uma relação mais ou menos íntima com os atos precedentes, dos quais são, ao mesmo tempo, o castigo pelo passado, e a prova para o futuro. São expiações nesse sentido de que são a consequência de uma falta, e provas em relação ao proveito que dela se retira. A razão nos diz que Deus não pode ferir um inocente; portanto, se somos feridos, é que não somos inocentes: o mal que sentimos é o castigo, a maneira pela qual o suportamos, é a prova.

Mas ocorre, frequentemente, que, a falta não se achando nesta vida, acusa-se a justiça de Deus, nega-se sua bondade, duvida-se mesmo de sua existência; aí, precisamente, está a prova mais escabrosa: a dúvida sobre a divindade. Quem admite um Deus soberanamente justo e bom deve-se dizer que ele não pode agir senão com sabedoria, mesmo nesse caso que não compreendemos, e que se sofremos uma pena, é que a merecemos; portanto, é uma expiação. O Espiritismo, pela revelação da grande lei da pluralidade das existências, levanta completamente o véu sobre o que essa questão deixava de obscuro; nos ensina que, se a falta não foi cometida nesta vida, o foi em uma outra, e que assim a justiça de Deus segue seu curso nos punindo por onde nós pecamos.

Quanto ao esquecimento das próprias faltas, a lembrança precisa dessas faltas traria inconvenientes extremamente graves, em que isso nos perturbaria, nos humilharia aos nossos próprios olhos e aos de nossos próximos; que nos traria uma perturbação nas relações sociais, e que, por isso mesmo, entravaria nosso livre arbítrio. De um outro lado, o esquecimento não é tão absoluto quanto se supõe; não ocorre senão durante a vida exterior de relação, no próprio interesse da Humanidade; mas a vida espiritual não tem solução de continuidade; o Espírito, seja na erraticidade, seja em seus momentos de emancipação, se lembra perfeitamente, e essa lembrança lhe deixa uma intuição que se traduz pela voz da consciência que o adverte do que deve fazer ou não fazer; se não a escuta, é, pois, culpado. O Espiritismo dá, além disso, ao homem um meio de remontar ao seu passado, senão nos atos precisos, pelo menos nos caracteres gerais desses atos que pesaram mais ou menos sobre a vida atual. Das tribulações que sofre, expiações ou provas, deve concluir que foi culpado; da natureza dessas tribulações, ajudado pelo estudo de suas tendências instintivas, e apoiando-se sobre o princípio de que a punição mais justa é aquela que é a consequência de sua falta, pode deduzir disso seu passado moral; suas más tendências lhe mostram o que resta de imperfeito a corrigir em si. A vida atual é para ele um novo ponto de partida; aqui chega rico ou pobre de boas qualidades; basta-lhe, pois, estudar a si mesmo para ver o que lhe falta, e se dizer: "Se sou punido, é que pequei," e a própria punição lhe ensinará o que fez.” (4)

Disse Platão (Espírito) em O Livro dos Espíritos: “...enquanto existir o mal entre os homens subsistirão os castigos.” (5)

Bezerra de Menezes em Estudos Filosóficos, afirma que “o Espiritismo não exclui os castigos, que constituem a sanção das leis divinas impostas à humanidade.” (6)

O Espírito André Luiz nos “Nos Domínios da Mediunidade”, recebe do instrutor Aulus as seguintes instruções: "é da Lei que cada alma receba da vida de conformidade com aquilo que dá,..."; "Há mil processos de reajuste, no Universo Infinito em que se cumprem os Desígnios do Senhor, chamam-se eles aflição, desencanto, cansaço, tédio, sofrimento, cárcere..." e "Há dolorosas reencarnações que significam tremenda luta expiatória para as almas necrosadas no vício. Temos, por exemplo, o mongolismo, a hidrocefalia, a paralisia, a cegueira, a epilepsia secundária, o idiotismo, o aleijão de nascença e muitos outros recursos angustiosos, embora, mas necessários, e que podem funcionar, em benefício da mente desequilibrada, desde o berço, em plena fase infantil. Na maioria das vezes, semelhantes processos de cura prodigalizam bons resultados pelas provações obrigatórias que oferece..." (7)

Paulo, Apóstolo (Espírito) em “O Livro dos Espíritos”, disse que o “castigo é a consequência natural, derivada desse (um) falso movimento; uma certa soma de dores necessária a desgostá-lo (o espírito infrator ou culpado) da sua deformidade, pela experimentação do sofrimento. O castigo é o aguilhão que estimula a alma, pela amargura, a se dobrar sobre si mesma e a buscar o porto de salvação. O castigo só tem por fim a reabilitação, a redenção. Querê-lo eterno, por uma falta não eterna, é negar-lhe toda a razão de ser.” (8)

Em «O Evangelho Segundo o Espiritismo, o codificador nos informa que o homem sofre sempre a consequência de suas faltas; não há uma só infração à lei de Deus que fique sem a correspondente punição. A severidade do castigo é proporcionada à gravidade da falta. Indeterminada é a duração do castigo, para qualquer falta; fica subordinada ao arrependimento do culpado e ao seu retorno a senda do bem; a pena dura tanto quanto a obstinação no mal; seria perpétua, se perpétua fosse a obstinação; dura pouco, se pronto é o arrependimento. Desde que o culpado clame por misericórdia, Deus o ouve e lhe concede a esperança. Mas, não basta o simples pesar do mal causado; é necessária a reparação, pelo que o culpado se vê submetido a novas provas em que pode, sempre por sua livre vontade, praticar o bem, reparando o mal que haja feito.” (9) (Os grifos são nossos)

Em “Instruções práticas sobre as Manifestações Espíritas, sobre as penas eternas, encontramos a seguinte informação: “Os Espíritos superiores nos ensinam que só o bem é eterno, porque é a essência de Deus, e que o mal terá um fim. Por consequência deste princípio, combatem a doutrina da eternidade da penas como contrária à ideia que Deus nos dá de sua justiça e de sua bondade. Mas a luz não se faz para os Espíritos senão proporcionalmente à sua elevação: nas classes inferiores suas ideias são ainda obscurecidas pela matéria; o futuro para eles está coberto por um véu. Não veem senão o presente. Estão na posição de um homem que sobe uma montanha: no fundo do vale a neblina e as voltas do caminho limitam-lhe a vista; é-lhe preciso chegar ao cimo para descortinar todo o horizonte, avaliar o caminho que fez e o que lhe resta fazer. Os Espíritos imperfeitos, não divisando o termo de seus sofrimentos, julgam sofrer sempre, e este pensamento mesmo é um castigo para eles. Se, pois, certos Espíritos nos falam de penas eternas, é porque eles próprios creem nelas em consequência de sua inferioridade.” (10)

Paulo, Apóstolo (Espírito) em resposta dada a questão 1009 de “O Livro dos Espíritos”, instrui que: “Oh! Em verdade vos digo, cessai, cessai de pôr em paralelo, na sua eternidade (dos castigos), o Bem, essência do Criador, com o Mal, essência da criatura. Fora criar uma penalidade injustificável. Afirmai, ao contrário, o abrandamento gradual dos castigos e das penas pelas transgressões e consagrareis a unidade divina, tendo unidos o sentimento e a razão.” (11) (O grifo é nosso)

Platão (Espírito) em O Livro dos Espíritos, na resposta da questão 1009 disse: “A eternidade das penas é relativa e não absoluta. Dia virá em que todos os homens se revestirão, pelo arrependimento, da roupagem da inocência, e nesse dia não haverá mais gemidos nem ranger de dentes.” (12)

São Luiz (Espírito) Paulo, Apóstolo (Espírito) em resposta dada a questão 1004 de “O LIVRO DOS ESPÍRITOS”, orienta que a duração dos sofrimentos do culpado tem “o tempo necessário ao seu melhoramento. O estado de sofrimento e de felicidade sendo proporcionais ao grau de pureza do Espírito, a duração e a natureza dos seus sofrimentos dependem do tempo que ele precisa para se melhorar. À medida que ele progride e que os seus sentimentos se depuram, seus sofrimentos diminuem e se modificam.” (13)

NOTAS:
(1) Allan Kardec, “Instruções práticas sobre as Manifestações Espíritas”, Vocabulário, Verbetes: Expiação e Provas. – EDICEL, tradução Cairbar Schutel
(2) Emmanuel, O Consolador”, 2ª. parte - cap. V - Provação - q. 246, FEB, psicografia F. C. Xavier.
(3) Allan Kardec, O Espiritismo na sua mais Simples Expressão”, Resumo dos Ensinamentos dos Espíritos. Tradução de Joaquim da Silva Sampaio Lobo, EDICEL.
(4) Allan Kardec, Revista Espírita de setembro de 1863, Sobre a expiação e a prova.
(5) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Duração das Penas Futuras, questão 1009. Tradução de J. Herculano Pires, LAKE.
(6) Bezerra de Menezes, cap. LXXXIV, Estudos Filosóficos, Edicel, São Paulo, Brasil, 1977.
(7) André Luiz, “Nos Domínios da Mediunidade”, — FEB — 14ª. edição — 1985. Médium psicógrafo F. C. Xavier.
(8) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Duração das Penas Futuras, questão 1009. Tradução de J. Herculano Pires, LAKE.
(9 Allan Kardec, “O Evangelho Segundo o Espiritismo” – Cap. XXVII - Pedi e obtereis - item 21. Tradução de J. Herculano Pires, LAKE.
(10) Allan Kardec, “Instruções práticas sobre as Manifestações Espíritas”, Vocabulário, Verbete: Penas Eternas – EDICEL, tradução Cairbar Schutel
(11) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Duração das Penas Futuras, questão 1009. Tradução de J. Herculano Pires, LAKE.
(12) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Duração das Penas Futuras, questão 1009. Tradução de J. Herculano Pires, LAKE.
(13) Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, Duração das Penas Futuras, questão 1004. Tradução de J. Herculano Pires, LAKE.

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